O Livro dos Espíritos – Mais Atual do que Nunca
No dia 18 de abril de 1857, um mestre impressor entregou 1200 cópias do livro a uma livraria no coração de Paris. Essa carga preciosa percorreu um longo caminho até seu destino, de Saint-Germain-en-Laye a Paris, em um percurso de 20 quilômetros, realizado por uma carruagem puxada por cavalos. O livro nasceu com uma missão que transcendia as expectativas de todos os seus criadores, incluindo seu autor. As edições, encadernadas em couro com letras douradas brilhantes, representavam a realização de um grande projeto.
Paris, a cidade das luzes, era a capital intelectual e artística do mundo ocidental no século XIX, sendo o berço dos mais importantes movimentos literários da época. Este foi o século de Victor Hugo, Madame de Stael, Alexandre Dumas, Gustave Flaubert e sua obra “Madame Bovary”, além de Emile Zola. Nas artes, a França era rica em gênios como Édouard Manet, Gustave Doré, Edgar Degas e Claude Monet. Em filosofia, o positivismo científico de Auguste Comte estabeleceu que o conhecimento autêntico provém apenas da confirmação de teorias por métodos científicos.
Entretanto, um fermento de uma revolução ainda maior estava se espalhando pela Europa, uma revolução intelectual que se ligava à França através de Lamarck, mas que também tinha raízes profundas no Reino Unido. Nos primeiros anos do século, descobertas em geologia e paleontologia prepararam o terreno para a ciência da evolução. Até 1844, o conceito de evolução já era amplamente aceito. Em 1851, Herbert Spencer cunhou a expressão “sobrevivência do mais apto”. Em 1855, Darwin trocou ideias e artigos com colegas sobre os mecanismos da evolução.
“A única fé inabalável é aquela que pode resistir à razão, frente a frente, em cada estágio do progresso da humanidade.”
A humanidade vivia um momento de grande antecipação e transição. As visões científicas sobre a evolução que dominavam os debates acadêmicos tinham o potencial de abalar os fundamentos da teologia religiosa. A evolução, se confirmada, desmentiria os conceitos bíblicos de criação e o papel de Deus na criação da Terra. A própria base da civilização judeu-cristã estava em grande risco. Foi nesse momento confuso da história humana que “O Livro dos Espíritos” foi lançado na França, quase dois anos antes da publicação de “A Origem das Espécies”, de Charles Darwin, na Inglaterra. Podemos apenas supor, com base no conhecimento espiritual atual, que isso não foi um acidente.
O extenso trabalho de pesquisa realizado pelo autor, que envolveu entrevistas com médiuns, compilação, organização e classificação do material recebido, começou dez anos antes. Com a ajuda de um pequeno número de colaboradores, foi articulada a filosofia que se tornou conhecida como Doutrina Espírita. No entanto, a obra não era uma simples compilação de ideias dispersas geradas por médiuns em diferentes países. O autor aplicou os princípios de uma metodologia positivista rigorosa a esse corpo de conhecimento. A importância desse fato não deve ser subestimada, uma vez que o positivismo representava, na época, a proposta mais avançada em uma área que viria a ser conhecida no século XX como filosofia da ciência.
Outro aspecto notável da postura do autor é a afirmação do conceito de evolução, não apenas no contexto das espécies biológicas, mas também no contexto mais complexo da transformação da alma humana. Em um único golpe, “O Livro dos Espíritos” destruiu o conceito de inferno como um lugar destinado aos miseráveis, já que cada alma teria o progresso contínuo como seu destino, e demonstrou como o espírito, ao encarnar na matéria, se torna um agente (e beneficiário) da evolução da espécie humana.
Atualmente, refletimos sobre a controvérsia que ainda persiste nos Estados Unidos acerca da teoria da evolução e do criacionismo. Mais de 50% da população americana ainda encontra considerável dificuldade em reavaliar a noção de que Deus criou os seres humanos como são atualmente. Os debates e polêmicas que dominaram os sistemas escolares nos Estados Unidos são indicações claras da magnitude da tarefa que foi realizada. A Doutrina Espírita estava à frente de seu tempo então e continua a estar hoje. A consciência das massas é apenas ocasionalmente permeável às ideias que as inteligências iluminadas transmitiram em “O Livro dos Espíritos”.
As ideias propostas em “O Livro dos Espíritos” não eram, e não são, de forma alguma, novas ou revolucionárias. Segundo o autor, o livro é apenas um repositório da sabedoria atemporal da humanidade. Mais de cinquenta milhões de cópias foram vendidas. Celebramos uma obra que rasgou os véus dos dogmas que eclipsaram a razão humana por séculos. Apropriadamente, rendemos homenagem neste livro a todos os heróis cujas palavras encontraram seu caminho no texto, a todos os heróis cujos esforços sustentaram a missão do autor e a todos os heróis que, do mundo espiritual, continuam a sustentar sua sabedoria. Além disso, agradecemos ao Criador, cuja respiração nos deu vida e cujo amor nos deu “O Livro dos Espíritos”.